Nada é capaz de despertar tanto a alegria de minha mãe como potinhos. Ela é a rainha dos potes: não joga nenhum fora. Mantém uma riqueza paralela sob a forma de plástico. Compra vários suportes transparentes no supermercado e ainda reaproveita as embalagens de sorvete e de margarina. Sua despensa encontra-se sempre cheia com um batalhão de vasilhas e tampas de todas as cores e tamanhos. Contaria com provisões para atender a ajuda humanitária da ONU e da Cruz Vermelha. Se eu abrir a porta do armário com muita pressa, posso ser soterrado por uma avalanche.

Os potes têm uma simbologia especial. São os fretes de seu amor, os carretos de sua gentileza. Recorre a eles para dividir as porções generosas de sua comida. Mesmo morando sozinha, cozinha como se os quatro filhos ainda estivessem à mesa. Não mudou a quantidade de ingredientes e as medidas das receitas de antigamente.

A mãe prova e demonstra que nos ama pelo estômago. O estômago é o seu coração. É impossível sair da casa materna de mãos vazias, sem uma sacolinha, com um pedaço de bolo, uma fatia de pudim, um pouco de ambrosia ou uma cumbuca de feijão de banha.

A cena é a mesma, conheço de cor. Quando digo que tenho de ir, ela se levanta de supetão e apressa os seus passinhos para o fundo da casa: “Ah... Só um minutinho”. E desaparece. Ouço o som da geladeira abrindo e fechando, o tilintar de talheres, e ela ressurge com uma marmitinha para mim. Eu respondo que não precisa, ela insiste e engancha a encomenda em meus dedos.

Ao beijá-la para me despedir, ela abençoa a minha testa com o sinal da cruz e pontua com firmeza tal mandamento bíblico: “Não esqueça de me devolver o potinho”.

Na verdade, ela não se importa com os potes, mas comigo. O pote é um pretexto. Já entendi que toda mãe guarda os potinhos para garantir a próxima visita do filho. A devolução é a esperança de que terá novamente as suas crianças grandes por perto.

FABRÍCIO CARPINEJAR É POETA E CRONISTA, AUTOR DE LIBERDADE NA VIDA É TER UM AMOR PARA SE PRENDER (EDITORA BELAS-LETRAS)