“Papai fez a passagem, meu querido amigo faleceu ontem às 22h20.” Começo o dia lendo essas palavras no Messenger, às 8 da manhã. Um grande amigo perdera seu pai na noite passada, e eu aqui escrevendo sobre a finitude, as passagens sem volta, e sobretudo sobre o que não vivi com o meu pai. Depois de amanhã olharei o calendário e me lembrarei que há 37 anos o meu se foi sem nenhuma despedida, uma carta, um último abraço, apenas foi para nunca mais voltar. Que indelicadeza. Voltando ao meu amigo querido, ainda não falei com ele, sempre não encontro palavras nesses momentos, talvez este texto me dê alguma. Até passarinho passa (Editora Moderna), do Bartolomeu Campos de Queirós (1944-2012), sempre me ilumina nessas horas, pois não encontramos sinal de tristeza na existência dos passarinhos criados por ele, mesmo sabendo que até passarinho passa.

Conhecer a literatura para infância do Bartolomeu me fez mais pleno, e acredito que as crianças que deparam com a sua literatura também experimentem essa plenitude. Meu blog sobre literatura para crianças teve Passarinho no nome, e um ano depois a minha editora também o teve. Foi a maneira de agradecer a esse escritor por tudo, até pela beleza das faltas, das lacunas da alma. Bartolomeu perdeu a sua mãe na infância assim como eu perdi o meu pai: essa perda prematura, a literatura, o amor pelas crianças, todas essas coisas me aproximam dele, me fazem ser um pouco Bartô.

Esse grande mineiro torna a infância maior e me faz encontrar outros três escritores que também reverenciam a criança: Severino Antônio, André Luís Oliveira e Marcelo Cunha Bueno. Severino, André e Marcelo sempre veem a criança como protagonista de suas histórias, tanto como criadora quanto como aquela que ajuda o mundo a nascer de novo! Cenas de infância (Adonis), de Severino Antônio, Calma, Martim! Foi só um dia ruim... (Amarilys), de André Luís Oliveira, e Sopa de pai (Passarinho), de Marcelo Cunha Bueno, engrandecem esse ser que necessita não só apenas de futuro, mas de presente também. Que as nossas crianças sejam inteiramente e intensamente crianças. Para finalizar, um trecho de Até passarinho passa, do Bartô: “Mas eu não encontrava sinal de tristeza na existência dos passarinhos. Um sempre contentamento brilhava entre suas penas. Todo o universo lhes parecia ser construído apenas de deslumbramentos”.

RENATO COELHO PASSARINHO É FAZEDOR DE LIVROS, PARA CRIANÇAS E JOVENS, NO NINHO DO PASSARINHO E QUER ESCREVER UM LIVRO DE LITERATURA PARA INFÂNCIA QUANDO CRESCER.