Eles estão em toda parte, mas você não se dá conta. Em suas buscas na internet, lá estão eles. Se você quer aplicar no mercado de ações, comprar um tênis ou contratar um financiamento imobiliário, é claro que eles estarão lá. Silenciosos, imperceptíveis, mas influenciando suas decisões. Você poderia achar que estamos falando sobre sua consciência, mas não. Estamos nos referindo aos algoritmos.

Em termos técnicos, um algoritmo é uma sequência lógica, finita e definida de instruções que devem ser seguidas para resolver um problema ou executar uma tarefa. Eles são muito utilizados na área de programação, descrevendo as etapas que precisam ser efetuadas para que um software execute as atribuições que lhe são designadas.

Qualquer programa de computador é composto por uma variedade de algoritmos sendo executados em alta velocidade. Nos casos mais avançados, eles podem nem ser escritos por um ser humano, mas por outros algoritmos. O aprendizado de máquinas é uma técnica de inteligência artificial moderna usada para ensinar aos computadores como realizar coisas que as pessoas podem fazer.

No entanto, eles não são restritos apenas à área computacional. O simples ato de um indivíduo se secar sempre na mesma ordem depois que sai do banho, por exemplo, já é considerado um algoritmo. Contudo, a relação do termo com o universo eletrônico é mais forte pela presença constante no nosso cotidiano, mesmo que não percebamos.

Dado esse cenário, muitas pessoas já começam a se perguntar até que ponto os algoritmos estão de fato influenciando nossa vida, seja no trabalho, nas tomadas de decisões ou no simples gosto do que escolhemos como entretenimento. “A internet criou um mundo de escolha infinita: se quero comprar um par de sapatos, em vez de ir à sapataria do bairro e escolher entre cem pares, posso ir a um site e escolher entre 1 milhão. Mas ninguém tem tempo de olhar 1 milhão de pares de sapatos. O que os algoritmos fazem, então, é escolher, dentre esse milhão, a centena que provavelmente nos agradará mais, e depois nós escolhemos dentre esses”, explica Pedro Domingos, professor de ciências da computação na Universidade de Washington, nos Estados Unidos, e autor do livro O algoritmo mestre (Editora Novatec).

Para Tom Griffiths, diretor do Laboratório de Ciência Cognitiva Computacional da Universidade da Califórnia em Berkeley, as eleições presidenciais de 2016 dos Estados Unidos dão um bom exemplo de como os algoritmos podem ter um impacto significativo em nossas vidas. Segundo ele, um dos problemas nessa eleição foi que as pessoas não estavam tendo uma cobertura equilibrada: como consequência do uso de plataformas de redes sociais, as pessoas estavam vendo histórias defendidas por pessoas com visões políticas similares e selecionadas pelas empresas de tecnologia para maximizar o engajamento. “Para mim, isso sugere um problema de projeto de algoritmo: existe um algoritmo melhor que podemos usar para selecionar as notícias que as pessoas veem para se certificar de que estão entendendo bem as questões que afetam sua sociedade? Do ponto de vista de um cientista da informática, trata-se de escolher a ‘função objetiva’ que estamos tentando otimizar ao mostrar o conteúdo. Mostrar às pessoas o que elas querem ver pode maximizar o número de vezes que elas clicam nos anúncios ou o tempo que gastam na plataforma. Penso que é hora de as empresas pensarem mais sobre essas funções objetivas e a sociedade começar a fazer perguntas sobre quais dessas funções são aceitáveis para as empresas usarem”, diz ele à Revista da Cultura.

Pensando nisso, recentemente Facebook e Google corrigiram seus sistemas de inteligência artificial para mostrar a seus usuários uma visão de mundo mais real. A intenção, além de manter a credibilidade do conteúdo, é proteger os usuários de uma exposição danosa na rede mundial de computadores, além de atacar a rentabilidade que esse conteúdo pernicioso pode gerar. A partir do momento em que isso pare de dar dinheiro, deixará de ser feito.

Existem softwares que mapeiam as preferências e rotinas das pessoas, não só nas redes sociais, mas também em outros ambientes públicos na internet, como sites de compras ou de pesquisa. Ao mapear essas preferências e hábitos de utilização, os softwares apresentam ofertas de produtos, serviços ou até mesmo ideias, no exato momento em que o internauta está mais disposto a aceitá-los.

“Eu mesmo passei por isso, quando estava esperando minha filha nascer. Naturalmente, passei a procurar mais pelo assunto e também produtos e serviços relacionados. Fiquei impressionado na época com o poder desses algoritmos, pois cada vez que entrava em algum site de lojas de departamento, na capa, só apareciam ofertas de carrinhos de bebê, fraldas e outros produtos do tema. Dado que nos tempos de hoje é rotineiro ao ser humano pesquisar qualquer coisa na web, as ações desses algoritmos influenciam substancialmente nas nossas decisões diárias”, afirma Ricardo Ribeiro Assink, especialista em engenharia de projetos de software e professor nos cursos de ciências da computação e sistemas de informação da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul).

Thiago Avelino, matemático pela Universidade de São Paulo (USP) e diretor de tecnologia da Nuveo, trabalha com inteligência artificial, rede neural e visão computacional. De acordo com ele, as pessoas adquirem produtos ou são impulsionadas a tomar determinada atitude porque os algoritmos nos jogam dentro de “bolhas de necessidades relativamente parecidas”. Portanto, grupos semelhantes – seja por gênero, idade ou classe social – consomem sempre as mesmas coisas.


E O FUTURO?
O dilema inevitável quando falamos sobre algoritmos é se um dia eles poderão definitivamente suplantar a vontade humana. Para Domingos, em muitas áreas, os algoritmos já nos suplantam. Em outras, vai demorar mais tempo. Ainda de acordo com ele, o fundamental é que as decisões finais estejam sempre a cargo dos humanos.

Outra questão que se impõe é se um dia eles poderão reproduzir nosso senso de justiça ou ética, por exemplo. O especialista responde afirmativamente. O problema é que nós somos pouco consistentes no nosso comportamento ético. Portanto, os computadores, ao observar nosso modo de agir, tendem a ficar bastante confusos. “Há também a hipótese de programar explicitamente os princípios éticos, mas isso será sempre uma solução incompleta, porque a ética é complexa e não pode ser reduzida a princípios abstratos”, opina.

Os computadores foram desenvolvidos com vistas a tentar imitar os processos de pensamento matemático humano. Como resultado, eles são realmente bons no raciocínio lógico, muito melhor do que nós. A dificuldade encontrada por eles é quando as perguntas não têm respostas perfeitamente lógicas. Isso requer um tipo diferente de matemática. “As pessoas ainda aprendem muitas coisas mais rapidamente do que os melhores métodos da ciência da computação. Mesmo que os computadores melhorem para resolver esses problemas, acho que ainda haverá espaço para a cognição humana fazer a diferença”, afirma Griffiths.

Há muitas questões que encontramos todos os dias não as reconhecendo como coisas de soluções simples e para as quais os algoritmos podem nos auxiliar: tentar comprar uma casa, encontrar um parceiro, escolher um restaurante ou mesmo encontrar um local de estacionamento são todos problemas que foram cuidadosamente analisados por cientistas da computação e matemáticos. “Acho que todos experimentamos menos estresse sobre essas decisões diárias sabendo que existem boas estratégias que podem ser usadas para resolvê-las”, avalia Griffiths.

Assim como qualquer outra criação da mente humana, em última análise os algoritmos existem para nos ajudar. Há os que monitoram frequência cardíaca, babás eletrônicas inteligentes e até mesmo o próprio uso do celular. “A evolução deles acompanha a evolução das tecnologias. Hoje nos comunicamos melhor, estamos mais próximos dos amigos e parentes, e muita coisa está mais simples de resolver por conta dos novos algoritmos. Acredito que eles só podem atrapalhar quando as intenções do criador são questionáveis”, comenta Assink.

Justamente aí entra a responsabilidade das grandes corporações de tecnologia, segundo Domingos. “Sendo as principais utilizadoras dos algoritmos para nos recomendar coisas e fazer escolhas por nós, a responsabilidade delas é assegurar que os algoritmos façam as mesmas escolhas que nós faríamos no seu lugar, e não apenas as escolhas que mais convêm à corporação”, relata.

Na legislação brasileira, existem leis relacionadas com a proteção de privacidade, em especial o Marco Civil da Internet, para punir a coleta de informações que exigem prévio consentimento do usuário. No entanto, ainda não há uma regulamentação mais específica quanto ao uso dos algoritmos. “Quando tratamos dos novos negócios tecnológicos, ainda há muitas lacunas regulatórias. Mas os provedores de aplicação têm, sim, responsabilidade na ocorrência de mau uso ou desvio de uso de suas ferramentas que possam gerar danos a terceiros, se houver comprovação de que aquele evento fazia parte dos riscos do próprio negócio ou que houve omissão ou negligência delas”, explica Patricia Peck Pinheiro, advogada especialista em Direito Digital.

Como a prática do marketing comportamental on-line ainda é relativamente recente, somente agora as discussões sobre os direitos efetivos dos usuários contra práticas abusivas estão ganhando terreno. “Devido ao impacto de imagem que esses incidentes podem envolver, muitas dessas plataformas já estão investindo em mecanismos para neutralizar esse tipo de atividade em seus ambientes digitais”, finaliza Pinheiro.