Pensava que seria fácil escrever este texto, que com as palavras certas transformaria uma despedida em um até breve, que essa homenagem se tornaria quase um enredo de um desses muitos livros que ainda não foram imaginados. Acontece que não sei bem por onde começar, pois tudo o que se escreva sobre Sergio Miguez me parece pouco diante do muito que ele era. Quando partiu dessa vida, com 55 anos, em 22 de setembro passado, no primeiro dia da primavera, fiquei a pensar que seu maior legado não era apenas o muito que fez pela literatura e pelo livro, mas justamente ter existido e permitido que tantas pessoas compartilhassem de sua companhia. Como diz Carol Grespan, diretora de arte desta publicação, “ele transformava as pessoas ao seu redor e essas sementes que espalhou continuarão brotando por um bom tempo”. Livreiro, curador e editor – foi sócio da Livraria Belas Artes e da Futuro Infinito, nos anos 1990 e início dos 2000 –, Miguez era também o companheiro de almoços, cafés e viagens, e, acima de tudo, uma espécie de pacificador. Bastava saber de alguma rusga entre duas ou mais pessoas que logo conseguia contornar a situação com uma sabedoria e calma invejáveis. Ele tinha sempre a palavra certa para a pessoa que precisava escutá-la. Detestava tristeza e até nos momentos mais dramáticos sabia tirar sarro do que estava a acontecer. A Revista da Cultura deve muito a Miguez, publicação da qual ele foi editor desde o primeiro número, em 2007, até 2012. No ano seguinte passou a assumir outras funções na Livraria Cultura, onde ficou até o fim de 2016. Paralelo a isso, bastavam 30 minutos de conversa para ouvi-lo contar sobre os muitos projetos pessoais que estavam em mente ou em ação. O que mais queria mesmo era espalhar cultura por todos os lados – basta pesquisar na web a hashtag #temmaisgentelendo, a qual ele criou, ou entrar na página do Facebook para ver como seu desejo deu certo.

Sergio Miguez faleceu em consequência de uma hepatite do tipo C. Não haverá mais encontros, risadas e brigadeiros, nem longas conversas sobre o papel dos livros no futuro. Agora o que ficou é isso que não tem nome nem se sabe exatamente o que é. Fica ali, bem espremido, entre a saudade, a alegria de ter sido seu amigo, a bronca por ele ter ido tão cedo, a gratidão pelo tanto que ensinou.

Gustavo Ranieri, editor-chefe