Viagens verídicas ousadas são temas frequentes no cinema. Gabriel e a montanha, cuja estreia está marcada para o início de novembro, vai nessa linha. Só que não se trata de uma aventura de forma convencional. Isso fica patente na primeira sequência, quando mostra-se o encontro do cadáver de Gabriel Buchmann no Monte Mulanje, na África. “Essa opção sempre esteve presente. É o evento que permitiu à família enterrá-lo e que me fez pensar nesse filme”, diz o realizador, Fellipe Barbosa. Amigo do protagonista desde a infância, ele sempre esteve a par daquela viagem em função de um doutorado em políticas públicas para países pobres. “O filme foi uma maneira de reencontrá-lo. Senti também que era a oportunidade de fazer o retrato de uma África humana e hospitaleira, longe dos estereótipos.”

Em seu segundo longa, o cineasta mesclou de forma eficaz a encenação e o documentário. “O roteiro final foi escrito a partir de depoimentos das pessoas que conheceram Gabriel nos seus últimos dois meses de vida em quatro dos sete países que ele percorreu. Foi um grande trabalho localizar esses personagens africanos, que se tornaram os próprios atores do filme”, declarou. Apesar da ausência de uma edição mais enxuta que eliminasse excessos (o turismo em Zanzibar), Gabriel e a montanha flui com autenticidade e acerta ao realçar as atitudes caprichosas de Gabriel (João Pedro Zappa), como a que provoca sua morte. Dessa maneira, lembrando Na natureza selvagem (2007), de Sean Penn, mostra que o afã de interagir plenamente pode resultar difícil e até perigoso.

O filme, pelo contrário, obteve imediata interação no Festival de Cannes, onde recebeu dois prêmios. “O de revelação foi atribuído pelo júri oficial. O da Fundação Gan é um aporte financeiro para distribuição na França, onde, em quatro semanas, já foi visto por cerca de 70 mil espectadores”, afirmou Barbosa. Um triunfo do cinema brasileiro.